Tenho a impressão de ter acontecido em 2015. Acordei agora e me sinto como se alguém tivesse colocado a tal “Boa noite, Cinderela” na minha caipirinha de tangerina com gengibre. (Se é pra tomar esta droga , melhor que seja com algum prazer verdadeiro). Não tenho bem certeza de que mundo é este. Sou capaz de observar eventos mas me sinto meio paralisada, incapaz de resistir. E desconfio que me violentaram.
Lembro-me muito bem da alegria de ver o empático Barak Obama na presidência dos Estados Unidos. Ele fez as pazes com Cuba, liderou as potências mundiais naquele acordo histórico de limitação nuclear com o Irã e ainda incluiu seu país no famoso Acordo Climático de Paris COP21. Por aqui no Reino Unido, tínhamos um governo conservador mas moderado – nas mãos de David Cameron(agora fétido) -, a libra comprava $1,6. Hoje, compra $1,2.



Ontem, o conhecido ultra direitista norte americano Steve Bannon, simpatizante da Supremacia Branca e de ideias fascistas, dava entrevista calmamente na Radio 4 da BBC onde parabenizava a eleição do maior palhaço político que esta ilha já viu: Boris Johnson. Há mais de duas décadas dou boas risadas com as besteiras que este cara faz. E diz. A frase que me passava na cabeça era do meu sábio avô: “Melhor ouvir isto que ser surda”.
No outro lado do Atlantico, temos Donald Trump. What can I say? O cara se recusa a publicar seu imposto de renda, é alvo de dezenas de investigações de assédio sexual, de sua situação econômica e de abuso do poder; retirou o país dos Acordos de Paris e do Irã; cortou impostos dos ricos, bagunçou os seguros saúde de milhões, liberou porte de armas, humilha as minorias – sejam African Americans ou deficientes -, manda ‘pra casa’ cidadãos norte-americanos com pais imigrantes…. Ou seja, é completamente contra o diálogo. Tem dois jeitos de fazer a coisa: o dele e o errado.
Nem vou falar do nosso presidente, orgulhoso de ser chamado de Trump Tropical. Tenho vontade de chorar; me dá dor no estômago. E não estou aqui dizendo que queria o PT ainda no governo. Apenas lamento, estupefata, a transformação de um mundo de cabeça aberta, bem intencionado, correndo atrás de igualdades e inclusões sociais, de sustentabilidade e diversidade para esta atual polarização de extremos, intransigência de ideias, intolerância de costumes, desrespeito ao próximo. É claro que tem muita gente ainda fazendo muita coisa boa, mas impera a falta de condescendência . E a incapacidade de escutar ao outro. Vingou o “Não sei , não quero saber e tenho raiva de quem sabe“.
Anos atrás , assisti a este Ted Talk da norte americana Celeste Headlee. “10 maneiras de se ter uma conversa melhor”. Eu sei, o título é besta igual aquela outros. Mas, na verdade, o talk é sobre como aprender a escutar melhor. É muito bom. Cada seis meses eu assisto de novo. Juro. E ainda me pego esquecendo muitos dos conselhos.
O curioso é que, apesar da total falta de disposição em realmente escutar os outros, se informar sobre o ponto de visto alheio e se engajar em discussões esclarecedoras, as pessoas estão cada vez mais atraídas por tudo quanto é besteirol escrito na internet. Na Medium, uma das plataformas de maior sucesso do mundo, publicam-se pérolas como “10 passos para se tornar um milionário em 5 anos”,”Por quê o tédio é tão importante na sua vida”, “Verdade desconfortáveis que você precisa aprender para ser feliz”, “8 pensamentos negativos que impedem o seu sucesso”, “Ser ocupado não significa que você tem sucesso”, “Se você não está aproveitando a vida, você está fazendo algo errado”, “Solucione os seus maiores problemas em alguns minutos”. Sério?!? Uma sequência de chavões; uma sucessão de colunas de auto ajuda.
E quando foi que as divertidas e inteligentes crônicas, relatos perspicazes de situações do cotidiano, se tornaram um bem elaborado argumento de como melhorar nossas vidas?! Tudo bem, eu tiro o chapéu para o encantador texto da gaúcha Martha Medeiros . Ela canta com as mãos. (bom, a gente não escreve com as mãos, mas a comparação foi bonita, né?) A leitura de A morte Devagar deveria ser obrigatória nas escolas. E nas faculdades. TODAS.
Agora tem gente escrevendo sobre como é bom acordar do lado do marido, ter uma amiga fiel ou chorar quando precisa. Ai , repito: Sério?!? Socorro!! E, se publicam, é porque tem público. Os mesmos que economizam frações de segundo escrevendo tb em vez de também ou deixando o predicted text terminar a palavra digitada, passam horas lendo “Como quebrar uma cadeia de pensamentos negativos” ou “Você não encontra o amor, você o constrói” ou, para terminar, “Parem de ser mimados e lutem pelos que querem” . (bocejos)
Sei que vão me chamar de saudosista, mas quero ler Drummond de Andrade, Stanislaw Ponte Preta, Antonio Maria, Rachel de Queiroz, Luis Fernando Veríssimo. Quiz dizer, quero ler escritores deste calibre. Comprei 10 livros quando fui ao Brasil em abril. So’ dois, coletâneas de crônicas da Martha, prestaram. PELAMORDEDEUS, tenho certeza que tem vida inteligente por aí. Recomendem algo para eu sair deste coma.
Insiro este video aqui porque me tocou demais. O apresentador da CNN ficou mas lágrimas ao comentar sobre os discursos inflamatórios e humilhantes do presidente Trump a respeito do povo de Baltimore.
Querida, deu errado! Como se diz por aqui “deu ruim pra todo lado”
Mas tenho uma sugestão de leitura “O quarto Branco” de uma jovem que escreve primorosamente, Gabriela Aguerre. Há vida inteligente ainda, mas não se sabe até quando, pois estamos sob o comando de um capitão do baixo clero que tem uma falha cognitiva considerável, além da do caráter, é claro.
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Oba. Vai pra lista. Compro aí daqui a pouco
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Que texto brilhante!!! Estamos vivendo o império da intolerância/ignorância/arrogância.. Me dá ânsia!
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